O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes determinou nesta quarta-feira (4) a inclusão do presidente Jair Bolsonaro como investigado no inquérito que apura a divulgação de informações falsas.
A decisão de Moraes atende ao pedido aprovado por unanimidade pelos ministros do TSE na sessão desta segunda (2) (veja detalhes abaixo).
A apuração levará em conta os ataques, sem provas, feitos pelo presidente às urnas eletrônicas e ao sistema eleitoral do país. Mesmo após ser eleito, Bolsonaro tem feito nos últimos três anos reiteradas declarações colocando em dúvida a lisura do processo eleitoral.
O inquérito das fake news foi aberto em março de 2019, por decisão do então presidente da Corte, ministro Dias Toffoli, para investigar notícias fraudulentas, ofensas e ameaças a ministros do Supremo Tribunal Federal.
O ministro Alexandre de Moraes é o relator dessa investigação e, por isso, coube a ele decidir sobre a inclusão do presidente Jair Bolsonaro.
O G1 pediu posicionamento do Palácio do Planalto sobre a decisão de Moraes e aguarda retorno.
O voto impresso já foi julgado inconstitucional pelo STF, e a tese de Bolsonaro de que pode não haver eleição no ano que vem já foi rechaçada pelos chefes dos demais poderes. Ao contrário do que Bolsonaro afirma, o sistema eleitoral atual já é auditável.
Na decisão em que atende o pedido do TSE, Moraes cita 11 crimes que, em tese, podem ter sido cometidos por Bolsonaro nos repetidos ataques às urnas e ao sistema eleitoral:
Moraes determinou que a Polícia Federal tome depoimento de quem acompanhou Bolsonaro na transmissão da última quinta (29) onde o presidente fez vários ataques às eleições:
Ataque as urnas
O presidente Jair Bolsonaro faz ataques ao sistema eleitoral brasileiro há mais de três anos, sem qualquer prova.
Nas últimas semanas, o presidente subiu o tom e chegou ameaçar a não realização de eleições caso não seja aprovada uma proposta de emenda à Constituição que garanta a impressão do voto na urna eletrônica.
A notícia-crime assinada pelo presidente do TSE, ministro Luís Roberto Barroso, encaminha para investigação a transmissão feita pelo presidente Bolsonaro na última quinta, em redes sociais e em canal oficial de TV.
O presidente da República chegou a convidar a imprensa para uma transmissão ao vivo onde apresentaria suas provas de falhas nas urnas. Em vez disso, repercutiu notícias falsas e vídeos já desmentidos.
Ao lado do ministro da Justiça, Anderson Torres, Bolsonaro teve de reconhecer que não tem provas da ocorrência de nenhuma fraude no sistema.
Na ocasião, o presidente se limitou a apresentar teorias antigas e comprovadamente falsas que circulam na internet sobre a urna – todas, já desmentidas pelo Tribunal Superior Eleitoral e por serviços de checagem da imprensa.
Nas declarações sobre o voto impresso e as urnas, o presidente também tem criticado ministros do tribunal, como o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministro Luís Roberto Barroso.
Segundo Moraes, a transmissão da última quinta também pode ter conexão com os fatos investigados em outro inquérito: o das milícias digitais, desdobramento da apuração dos atos inconstitucionais.
“Nesse contexto, não há dúvidas de que as condutas do presidente da República insinuaram a prática de atos ilícitos por membros da Suprema Corte, utilizando-se do modus operandi de esquemas de divulgação em massa nas redes sociais, com o intuito de lesar ou expor a perigo de lesão a independência do Poder Judiciário, o Estado de Direito e a Democracia", diz Moraes.
Por isso, segundo o ministro, é "imprescindível a adoção de medidas que elucidem os fatos investigados, especialmente diante da existência de uma organização criminosa [...] que, ilicitamente, contribuiu para a disseminação das notícias fraudulentas sobre as condutas dos ministros do Supremo Tribunal Federal e contra o sistema de votação no Brasil, tais como as constantes na live do dia 29/7/2021, objeto da notícia crime”.
O ministro afirmou que “a partir de afirmações falsas, reiteradamente repetidas por meio de mídias sociais e assemelhadas, formula-se uma narrativa que, a um só tempo, deslegitima as instituições democráticas e estimula que grupos de apoiadores ataquem pessoalmente pessoas que representam as instituições, pretendendo sua destituição e substituição por outras alinhadas ao grupo político do Presidente", apontou o magistrado.
Ainda na decisão, Moraes fez um relato do andamento das investigações do inquérito das fake news.
Segundo o ministro, as apurações "indicaram a existência de uma associação criminosa, denominada 'gabinete do ódio', dedicada à disseminação de notícias falsas, ataques ofensivos a diversas pessoas, às autoridades e às Instituições, entre elas o Supremo Tribunal Federal, com flagrante conteúdo de ódio, subversão da ordem e incentivo à quebra da normalidade institucional e democrática".
"Apurou-se que diversos investigados integrariam um complexo esquema de disseminação de notícias falsas por intermédio de publicações em redes sociais, atingindo um público diário de milhões de pessoas, expondo a perigo de lesão, com suas notícias ofensivas e fraudulentas, a independência dos poderes, o Estado de Direito e a Democracia", escreveu.
Também de acordo com o ministro, "essa estrutura, aparentemente, estaria sendo financiada por empresários que, conforme os indícios constantes dos autos, atuariam de maneira velada fornecendo recursos das mais variadas formas, para os integrantes dessa organização".
A investigação criminal pode, posteriormente, tornar Bolsonaro inelegível. Isso só ocorre, no entanto, se:
Inquérito administrativo
Além de pedir a inclusão de Bolsonaro no inquérito do Supremo, os ministros do TSE também aprovaram por unanimidade a abertura de um inquérito administrativo, no âmbito da Corte, para apurar ataques à legitimidade das eleições.
A proposta partiu do corregedor eleitoral, ministro Luís Felipe Salomão. Serão investigadas infrações como corrupção, fraude, condutas vedadas a agentes públicos, abuso de poder político e econômico e propaganda fora do período de eleições.
Ao apresentar seu apoio à proposta, o ministro Alexandre de Moraes ressaltou que “com a democracia não se brinca, não se joga”.
Assim como a investigação criminal, este inquérito também pode gerar inelegibilidade ao presidente Bolsonaro - por abrir espaço para multas na Justiça Eleitoral, além de servir como base para a contestação de um eventual registro de candidatura de Bolsonaro à reeleição.
O registro de candidaturas, feito em agosto do ano eleitoral, é contestado por iniciativa do Ministério Público, de partidos políticos ou por candidatos.